Maria
Jorge
Bela viveu no seio duma
família remediada. Talvez por o seu pai ser uma pessoa pouco presente, uma vez
que era embarcado nos barcos de bacalhau e, naquela época, passava meses
consecutivos nos bancos da Terra Nova e Gronelândia, a cumplicidade deles era muito
grande e o tempo que passava em terra era pouco para estarem juntos,
recuperando da ausência, e matarem saudades. No que se refere à mãe, pessoa
austera e fria nunca lhe deu liberdade para criar amizades. Nunca recebeu um
carinho ou um beijo de boa-noite.
Talvez pelo ambiente
familiar e por ter sido tão oprimida pela mãe, Bela era uma criança rebelde e
desobediente. Já mulher era muito introvertida e o seu semblante era carregado,
aparentando frieza.
Constituiu família e pensa
ter sido feliz durante alguns anos. Vivia exclusivamente para a sua nova
família e para o trabalho. Amigos? Poucos e esses tinham vindo através do
marido, pessoa muito extrovertida e o oposto de Bela.
E, como tudo tem um fim,
também o seu casamento acabou. Demorou muito tempo a recompor-se. O castelo que
demorou tantos anos a construir e pelo qual tanto lutou, ruiu apenas de um dia
para o outro. Sofreu, cometeu erros, alguns grandes, outros enormes. Julgava-se
um farrapo, olhava-se ao espelho e não gostava do que via. Afinal porque
acreditava tanto nas pessoas que se cruzavam com ela?
“A partir de hoje, vou ser
uma pessoa diferente, não vou ser mais enganada, as pessoas não merecem nada” –
pensava Bela, mas… só pensava. No outro dia estava a cometer, se não os mesmos,
outros erros de menor importância. Porque o seu semblante carregado aparentando
frieza esconde um coração carente de afeto e amor ao próximo.
Há poucos anos Bela conheceu
um casal que vivia em união de facto. Pouca afinidade tinha com eles,
escondia-se um pouco na sua concha.
Subitamente o homem adoeceu
e Bela prontamente foi ter com eles oferecendo-se para os ajudar naquilo que
fosse preciso. Talvez para não incomodarem, sempre recusaram educadamente. Mas
um dia, e há sempre um dia, precisaram de ir ao IPO a Coimbra. Humildemente
pediram a Bela para os acompanhar. Acedeu prontamente, desmarcando compromissos
que tinha, dizendo que, sempre que precisassem de se deslocar, podiam contar
com ela.
Indiferente ao mundo cruel
que a rodeia, Bela é assim mesmo. Por detrás daquela máscara, está um coração
sensível … quantas vezes amargurado. Uma pessoa que, sempre com um sorriso nos
lábios, está pronta e disponível para ajudar quem precise.
Ontem, talvez um pouco
envergonhados, o casal bateu-lhe à porta. Precisavam de uma testemunha, porque
iam casar. Essa testemunha, só podia ser ela depois de tudo que tem feito e
continua a fazer por eles.
Ambos divorciados de
matrimónios anteriores e com descendentes, vivem há nove anos juntos. A mulher,
estrangeira, tem sido duma dedicação ímpar a este homem. Meteu baixa clínica
para cuidar do seu companheiro, não recebendo o respetivo subsídio, porque a
lei não o permite, mas pelo menos está numa situação legal perante a entidade
patronal. Ele, com cancro maligno na próstata e talvez consciente do seu fim
próximo, reconhecendo o que esta mulher tem feito por ele e que, com a sua
morte, ficará desprotegida, quis oficializar a situação
Hoje Bela foi testemunhar.
Estava muito feliz e comovida. Deu consigo a pensar que vale a pena ser como é,
cheia de afetos e de amor pelo próximo, mesmo que muitas vezes não seja
correspondida.
Porque, aos 65 anos é bom e
gratificante acreditar que o Pai Natal existe.
Maria, para comentar este texto,eu vou usar uma citação "Deu consigo a pensar que vale a pena ser como é, cheia de afetos e de amor pelo próximo, mesmo que muitas vezes não seja correspondida."
ResponderEliminarQue bom olhares-te no espelho e veres-te, sem máscara, como és: Bela.
Obrigada Fernanda. Comovi-me muito ao ler o seu comentário. Usa sempre as palavras corretas.
EliminarEu não acredito que o Pai Natal exista! Será por não ter ainda 65 anos? Apesar disso, gosto de coexistir com a "diferença". A nossa prática, de todos os dias, é o que conta, com pai natal ou sem Ele.
ResponderEliminarUma publicação com nome: Maria! Não, não me enganei, eu sei que a protagonista se chama Bela mas para mim ela é a Maria que eu conheço: simples, sincera, amiga do seu amigo e até do seu inimigo. Só não lhe pisem os pés por favor porque aí a Maria deixa de ser Bela e aí de nós e... dela!
ResponderEliminarE depois ainda bem que a magia do Pai Natal se prolonga pelos 365 dias do ano inteiro - assim vale a pena ser Pai Natal!
Ao ler o teu texto,visualizei a vida da Bela.Realmente era essa a impressão que havia da Bela de então. Hoje, essa Bela
ResponderEliminardesbloqueou e deixou sair a linda Bela que era desconhecida de algumas pessoas. Pois é minha amiga; continua com a tua magia.
Quem se disponibiliza tão prontamente para ajudar o próximo, em dificuldades, partillhando as suas dores e sente, como seus,os momentos de felicidade dos outros chame-se Bela ou Maria é um belo ser humano. Continue a promover o Amor, Maria.
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