Fernanda Reigota
Mal aparecem as primeiras
aragens que perfumam o ar com o cheiro das mimosas, a primavera está anunciada.
Depois é só prestar
atenção e ir descobrindo umas papoilas rubras como os sonhos da infância; umas hortênsias azuis, resistentes e dignas, como os
ideais da juventude; umas margaridas amarelas, amigas e amorosas, como a
consistência dos sentimentos da idade adulta; ou uns miosótis, frágeis mas fraternos, como a experiência da idade madura.
Imagino
caminhadas em campos que me vão oferecendo esta profusão de manchas coloridas
que, para mim, são símbolos de plenitude e da verdadeira harmonia entre as
pessoas. Num campo assim, congestionado por todas as promessas de vida que se
renova, respiro fundo e esqueço, por momentos, o que estão a fazer ao meu país.
A criança que eu já fui e
a criança que ainda sou procuram um cheiro, procuram um objeto. Evocado esse cheiro
com muita intensidade, a qualquer momento serei transportada para a minha
infância. Desembarcarei na plataforma do alpendre para onde dava aquela porta
de cozinha de aldeia.
Entro e vejo que tudo está
novamente preparado para amassar os folares: já lá está a gamela, no chão,
sobre um pano branco grande, o saco da farinha, os ovos, o acrescento bem lêvedo,
a água quente para ir molhando as mãos e a canela num cartucho de papel branco…
Para que o casamento dos cheiros seja completo procuro o fermento e,
avidamente, desfaço um pouco entre os dedos e extasio-me.