José Luis Vaz
Em pouco tempo e quase sem me aperceber,
descobri, nesta fase da minha vida, mais um prazer: escrever. Integrado num
grupo de escrita, as nossas experiências de vida são revividas com o entusiasmo
de quem quer contar uma história que muito nos diz. E assim se começa uma
atividade que julgávamos estar só ao alcance de alguns.
As minhas emoções passam para o texto com a
mesma facilidade com que a memória de acontecimentos antigos me faz reviver
tristezas, alegrias e tantas saudades daqueles que tanto amei.
Um dia, o desafio era fazermos um texto que
refletisse grande tensão psicológica realçando, naturalmente, as alegrias e
tristezas inerentes a essa situação. De imediato, tive a certeza do que iria
escrever. Há marcas, momentos vividos, situações duras, que julgamos arrumadas
no nosso cérebro, só para recordar, quando, com alguém muito íntimo, decidimos
partilhar. Mas, pensei alguns dias, sobre a forma como iria fazer o meu
trabalho e cheguei à conclusão que me tinha precipitado, porque era impossível,
escrever uma pequena história com o assunto que me propunha abordar. Tratava-se
de rebuscar nos armários do pensamento um acontecimento que muito tinha para
desenvolver e que, ainda por cima, tanto me dizia.
E então decidi. Vou escrever uma história
arrumada no tempo, mas, nunca esquecida. Ela refletirá o que ficou em mim
daquilo a que assisti, o rigor do que mais importante se passou, as saudades
daqueles que já se foram e, acima de tudo, o meu testemunho para a minha
companheira, cúmplice da minha vida, para meus filhos e para meus netos. Será a
história de um irmão meu, cunhado de quem minha companheira foi irmã, será a
história de um tio que meus filhos tiveram e que teve a coragem de ter
desertado da guerra colonial. Poderá, se assim se entender, ser uma homenagem a
título póstumo ao meu querido e saudoso irmão.
A história é verídica, os nomes, colhê-los-ei
no reino da ficção, porque é uma espécie de protecionismo com que pretendo
salvaguardar os meus, evidenciando aquilo que retenho como mais importante, a
fortíssima pressão psicológica com que alguém viveu e a sucessão de
acontecimentos que dominou parte da vida de uma pessoa e da sua família.
Descobri nos documentos que pesquisei a carta
da mãe sofrida dirigida ao ministro do exército. Foi escrita em seis de
fevereiro de mil novecentos e sessenta e três. Nesse dia fiz doze anos. Isso, eu
não retive ao longo de quase cinquenta anos. A infelicidade de meu irmão e a
angústia por todos nós vivida, especialmente pelos nossos pais, essas sim,
sempre me têm acompanhado.
E o texto nasceu, como dádiva da memória e das emoções, mas também como repúdio por um tempo de escravatura que não vamos deixar repetir.
ResponderEliminarAguardamo-lo com a certeza de irmos ser surpreendidos.
A Fernanda é a responsável por esta nova aventura. Tudo parece fácil... A sua elevada competência aliada à capacidade do estímulo,no momento próprio, como se faz a um pássaro para voar, de nos empurrar, para a ousadia de escrever e até publicar. A minha maior gratidão.
EliminarÀ responsável, pela imagem do nosso blog, um beijinho grande.
ResponderEliminarA tua cumplicidade, há muito, que me acompanha. A citação de Eugénio de Andrade, neste texto, é disso a maior prova. Nunca vias o que escrevia mas percebias as lágrimas que acompanharam as palavras arrancadas à angústia das memórias. Obrigado.
E como estou ansioso por o começar a ler...
ResponderEliminarÉ incrível como me continuas a conseguir surpreender!
Ainda há quem diga "sou velho demais para mudar"...
...e nunca é tarde para mudar!
Tu és a prova disso.
Descobriste na escrita uma forma de dizer o que por palavras parece ser impossível! Continua, não pares!
Queremos mais!
Peço desculpa de só agora dar a minha opinião, mas onde estou,só há dois dias consegui internet.Sou da mesma opinião;podemos escrever memórias retidas,tanto tempo e que podemos partilhar.
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