terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

As cidades e as cores



Albertina Vaz


Naquela terra havia janelas de todas as cores – vermelhas, verdes, amareladas, lilases, azuladas, branquinhas e até da cor do mar. E de formas muito diversas, umas redondas, outras retangulares, outras em forma de triângulo, outras arredondadas no topo. Até os tamanhos – que promiscuidade enorme: umas grandes, outras pequenas, umas esguias a lembrar vitrais, outras enormes a rasgar paredes.
Em todas as casas se viam janelas - vidros pequenos e cortinas branquinhas a bordar dentro delas. E havia também muita cor – e a cor era um passo de dança e um som a compasso vibrando no ar.
E o espaço estava cheio – E de que maneira!!! – com aquelas janelas de mil formas e mil cores.

Mas aquelas janelas viviam nas casas e as casas também tinham portas. Portas antigas de madeira maciça e aldrabas pesadas cujos batentes soavam em eco quando se batia nelas. Portas leves como plumas esvoaçando ao vento norte portador da mensagem do longe e da distância que se esfuma na linha do horizonte.
E as portas também eram de muitas cores e de muitas formas e de muitos materiais. Umas finas que nem papel, outras pesadas, gordas. Imensas. Umas até tinham um quadradinho, feito janela, por onde o sol entrava. Às vezes, nesses postigos – porque de pequenos postigos se tratava – havia cortinas iguais às das janelas.



E as casas também tinham chaminés: umas altas, de grande porte, outras médias a misturarem-se sem se fazerem notadas, outras pequeninas de pedra sobreposta, outras tapadas para impedir a entrada da chuva, umas cinzentas do fumo da lareira, outras branquinhas pintadas a cal.
No centro da terra até havia uma igreja e uma escola e um parque cheio de árvores frondosas e bancos, para se sentarem, e uma fonte de água que cai em repuxo da boca de um menino de pedra feito arte e magia.
Naquela terra havia tudo mas tudo parecia nada. Naquela terra as folhas amontoavam-se pelas ruas e as ruas desciam para o rio tal como a vida evolui, em crescendo, em direção ao mar. Naquela terra tudo parecia perfeito como perfeito era o sol que continuava a brilhar cada dia que se renova no tempo que se esvai.
Só não havia pessoas, pessoas de verdade! Era uma cidade abandonada, num país perdido, onde as casas e as janelas se foram fechando – semicerrando. As pessoas foram-se para longe – para muito longe. E quando voltarem – se voltarem – as cores das janelas já não serão azuis nem amarelas; as cores das janelas terão perdido a sua cor.


3 comentários:

  1. O teu texto, repleto de cores, remete-me para temas sombrios, como o isolamento e a desertificação. Sem pessoas nada faz sentido.

    ResponderEliminar
  2. ZECA AFONSO E JOSÉ M: BRANCO
    No céu cinzento sob o astro mudo
    Batendo as asas pela noite calada
    Vêm em bandos com pés de veludo
    Chupar o sangue fresco da manada

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    A toda a parte chegam os vampiros
    Poisam nos prédios poisam nas calçadas
    Trazem no ventre despojos antigos
    Mas nada os prende ás vidas acabadas

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    Se alguém se engana com seu ar sisudo
    E lhes franqueia as portas à chegada

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    No chão do medo tombam os vencidos
    Ouvem-se os gritos na noite abafada
    Jazem nos fossos Vítimas dum credo
    E não se esgota o sangue da manada

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    São os mordomos do universo todo
    Senhores à força mandadores sem lei
    Enchem as tulhas bebem vinho novo
    Dançam a ronda no pinhal do rei

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    Se alguém se engana com seu ar sisudo
    E lhes franqueia as portas à chegada

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada


    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada
    Eles comem tudo, eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    ResponderEliminar
  3. Realmente, é uma tristeza ver tantas aldeias desertas. Fogem os mais novos à procura de novos horizontes. Ficam os mais enraizados à sua terra. Por nada a querem deixar, enquanto tiverem um fôlego que os deixe respirar o ar da terra mãe.

    ResponderEliminar

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...