Albertina Vaz
Não sei que te diga, nem sei se te diga.
Não sei se sou capaz de falar das palavras, dos dias que corremos juntos, que passeámos de mão dada junto ao rio, que te ouvi e me ouvi, em que te confessei segredos, em que partilhámos sonhos, em que seguraste a minha mão e me levaste a transpor um degrau difícil, um obstáculo penoso.
Não sei se sou capaz de recordar aquele sorriso dos teus olhos, aquela mão que me segurava, ou a tua voz grave que me prevenia dos caminhos tortuosos e serenava as minhas dúvidas quando o desconhecido me assustava ou o ignoto me atraía.
Não sei se vou esquecer aquele circo repleto de animais e palhaços e acrobatas a que assistíamos juntos saboreando a magia de que tanto gostávamos e o feitiço duma noite diferente em que a tua mão prendia a minha e eu vivia o sonho de estar contigo e estarmos juntos.
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aquela mão que me segurava |
Não sei se vou conseguir esquecer aquelas manhãs de sol, as gaivotas a circularem à nossa volta e os patos em fila a fugirem perseguidos pelo gato e tu e eu a rirmos até cairmos numa alegria feita esperança e sol nascente.
Não sei se ainda me lembro daqueles dias em que as nossas vozes se cruzavam e se digladiavam discordando e discutindo como se o mundo fosse acabar no dia seguinte, ou mesmo naquele dia. Não sei se me recordo dos dias em que nos deitámos de costas voltadas e de testa enrugada como se nunca mais houvesse possibilidade de voltarmos a apertar as nossas mãos.

Não sei se ainda me lembro da primeira vez que me levaste a ver um filme com uma história de fantasia em que a quimera se transformava em devaneio e a utopia se instalava sem receio, como se a vida de cada um de nós se esgotasse ali, naquele segundo, naquele instante.