Albertina Vaz
Tinha uma caneta na mão:
olhei dum lado, do outro, de trás e de frente. Era igual a tantas outras –
canetas grandes, pequenas, azuis, simples, de tantas e tão variadas cores.
Tantos tamanhos, tantas formas, tantos cheiros: há até canetas que falam, que
dizem… coisas. Umas sem nexo como olá, tudo bem? Outras são canetas que não
falam mas transmitem: gosto de ti, amo-te muito, não vou esquecer-me, tenho
tantas … saudades!
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Umas falam de campos em flor |
São sempre canetas, é claro.
Só que umas são canetas com cor e outras não passam de sombras; umas são
canetas que falam de dias de sol e de campos em flor; outras são canetas que só
vêm dias de nuvens cinzentas num céu sombrio a ameaçar tempestade. Umas são
canetas dançarinas que falam de modas e que gostam de gostos de quem toda a
gente gosta: são canetas vazias, sem conteúdo ou sem interior. Outras são canetas
cinzentas, quase que relatam os factos e choram sobre um passado ou sobre um
presente que, de tão negro, se faz negro profundo e termina quase, quase num
fim de mundo.
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Há canetas... que fazem da vida uma roda de mil cores |
Há canetas vermelhas, azuis,
amarelas… há canetas que brilham, que sorriem, que soltam gargalhadas e que
fazem da vida uma roda de mil cores. Como um arco-íris, ou um círculo que vai e
volta, num voltejar duma narceja que atravessa a ria refrescando o vento num
agitar de asas remanseado pela brisa que se esgota num dia de Verão.
Há ainda aquelas canetas que
sorriem de sarcasmo, que tudo criticam e que sabem – ah! sim elas sabem – que
tudo está mal e que elas nada fizeram, nem contribuíram para esse erro que faz
parte da história de todos nós e enche o céu onde proliferam as estrelas e onde
tudo é perfeito.
Depois há as canetas dos
doutores, dos que sabem a verdade e que a detêm como absoluta, a verdade que é
a sua e que, de uma forma ou de outra, tem de ser imposta, sub-repticiamente,
sem que alguém dê por isso ou sem que alguém se aperceba de que ela está a
chegar, a entrar, a introduzir-se devagarinho, a instalar-se, a tomar o seu
lugar.