domingo, 31 de maio de 2015

ILUSÃO

Maria Celeste Salgueiro
Na alma uma ânsia de tudo aprender!

Eu já fui criança de bibe e calção,
Com outras crianças alegre a correr;
No pátio da escola jogando o pião,
Na alma uma ânsia de tudo aprender!

Recordo o meu mestre de vara na mão
Impondo respeito, voz alta a dizer
“Isto é como um jogo, ouçam a lição,
Vão ver como é fácil a arte de ler”.

Dizia a verdade, foi quase a brincar,
Podia as palavras enfim decifrar!
Que grande alegria, que orgulho  profundo!

Naquele momento eu era o melhor,
A vida era bela e o sol com mais cor,
Julguei que podia ser dono do mundo!

Maria Celeste Salgueiro ©2015,Aveiro,Portugal

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Ontem tive um sonho


Albertina Vaz


Ontem tive um sonho. Mas um sonho é um sonho. Apenas isso. Este era um sonho verde, onde as cores apareciam muito nítidas e mergulhantes. Numa cidade como a nossa é fácil imaginar o azul da ria e o verde que a envolve. É fácil sonhar com a realidade quando ela se interioriza e se incorpora dentro do nosso imaginário.

Sonhei enquanto dormia!
Sonhei que tínhamos uma avenida cheia de árvores frondosas, cobertas de flores brancas e rosadas que da estação nos convidavam para descer à ria e espraiar o olhar até um horizonte sem fim onde o céu se confunde com o mar.

Sonhei que, no Alboi, ainda lá estavam aquelas árvores velhinhas, todas muito bem podadas e que um mágico, envolto em bruma, havia tratado com tanto carinho e sabedoria que floresciam orgulhosamente procurando o azul do nosso céu. Sonhei que o Parque da Cidade voltava a ter crianças, patos e gaivotas douradas e as máquinas tinham desaparecido de vez.

Sonhei que havia verde, muito verde, na nossa cidade e que até o céu espelhava o verde das árvores e o azul da água a correr para o mar.

Sonhei enquanto dormia! E o sono é realmente o espaço em que o imaginário parece real. 

Albertina Vaz ©2015,Aveiro,Portugal

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Presente Inesperado

Aida Viegas


Indo eu serena e calma
Passeando à beira mar
Vi um baile de gaivotas
Como nunca vira tal
Eram tantas, tantas, tantas
Mais parecia um festival
Um festival de estrelas
Estrelas cadentes fugidas
Do complexo astral.

Mas eram tantas, tão lindas
O céu estava pedernento                         
O sol espreitava medroso
O mar estava cinzento
E o vento donairoso.
E entre o céu e o mar
Por ali, em revoada
O bando andava a pairar
Em gorjeios e requebros
De estranha coreografia.
Iam e vinham ligeiras
Cruzavam-se sorrateiras
Adejando de alegria.
Subiam agora, leves
Mais leves que o puro ar
Revolteavam e vinham
Airosas a areia beijar.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Um sonho

                                                                                                                                       Maria Jorge

    Joãozinho, igual a tantos outros, de tão irrequieto e curioso, cansava o mais paciente. Próprio de uma criança de 10 anos, estava na idade de todos os porquês. A sua cabecita estava povoada de imensas perguntas e gostava de ter respostas, mas nem sempre tinha êxito. Via coisas na escola com que não concordava, ouvia na TV algumas notícias que o intrigavam mas os seus pais raramente tinham tempo para lhe explicar o porquê daquil
    Mas Joãozinho nunca desistia de satisfazer a sua curiosidade. E quem melhor para o fazer do que a sua avó que já tinha todo o tempo do mundo?
Avó, ando muito intrigado com algumas notícias que tenho visto na TV.
O quê meu filho?
... e chamam a isto racismo.
Nos Estados Unidos, os polícias têm matado miúdos pouco mais velhos do que eu. E depois dizem que são polícias brancos que matam meninos negros e chamam a isto racismo. O que é isso de racismo?
Racismo filho… é um pouco difícil. Sabes que no mundo há crianças que nascem brancas, amarelas, negras, olhos em bico, cabelos louros outros de cabelo escuro liso ou encaracolado, depois quando crescem uns são altos, outros baixos, escolhem a religião que querem seguir, enfim, não somos todos iguais por fora. Vou-te contar uma história verídica, ouve com atenção.
Está bem avó, vou prestar muita atenção para ver se vou ficar sem dúvidas.
Era uma vez um menino que teve um sonho: todos diferentes, todos iguais, independentemente de raças, crenças, religião ou costumes.
E foi assim que em Atlanta, no estado da Geórgia dos Estados Unidos da América, no dia 15 de Janeiro de 1929, nasceu uma criança do sexo masculino e de raça negra, a que legalmente foi dado o nome de Michael King. Mais tarde o seu pai, argumentando que foi incorretamente registado, retificaria o seu nome.
Filho e neto de pastores protestantes batistas, depois de ler diversas passagens da Bíblia, muito cedo e no que se refere à religião, decide seguir os mesmos passos dos seus antepassados. Em 1951, com 22 anos, licenciou-se em Teologia na Morehouse College. Seguidamente fez o doutoramento em Filosofia na Universidade de Boston.

Para além de ser pastor protestante foi um grande ativista político norte-americano
"Eu tenho um sonho!"

contemporâneo. Lutou contra a discriminação racial e tornou-se num dos mais importantes lideres dos movimentos civis dos negros nos Estados Unidos.
Em 1954 foi para a cidade de Montgomery, no estado de Alabama para exercer as suas funções de pastor. Era nesta cidade, na parte Sul dos Estados Unidos da América, que se verificavam os maiores conflitos raciais e após a prisão de uma mulher negra, Rosa Parks, por se recusar dar o lugar a uma mulher branca, começou a sua luta incansável pela igualdade das raças.     
Em 1957 foi fundador e presidente da Conferência da Liderança Cristã do Sul, organizando campanhas pelos direitos civis dos negros, baseadas na filosofia da não-violência.
E foi assim que a partir de 1960, institucionalmente, os negros têm acesso a parques públicos, bibliotecas e restaurantes.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Retrato do menino enquanto gente


Albertina Vaz


Por aqui! Por aqui. Vire tudo à direita. Um bocadinho mais. Agora para trás, para trás. Mais um bocadinho. Tudo para a frente. Já está. Perfeito! Uma moedinha, por favor.
Aspeto descuidado mas ágil no andar, ele ali está, diariamente, como se dirigir o trânsito
O meu menino é d'oiro...
e, mais concretamente, arranjar um lugar para arrumar um carro, fosse o trabalho mais importante do mundo. E afinal era. Para ele, claro. Era a forma de arranjar uns trocos. E uns trocos representavam uma sandes, uma sopa, um copo. Noutros tempos não lhe chegavam uns trocos. Precisava de muito mais do que trocos para vencer o vício. Mas deixara-se disso. A muito custo, mas deixara. Foram tempos difíceis esses em que tivera de lutar contra um desejo desmedido que nada saciava e tudo exigia. Valeram-lhe, nesse época, aqueles senhores de todas as noites que apareciam com sopa quentinha, um pão e às vezes qualquer coisita mais.
O meu menino é d’oiro/ é d’oiro fino/ Não façam caso/ Que é pequenino.” – cantava lá longe uma voz que não queria ouvir.
Por que começara a drogar-se? Isso era uma longa história com raízes tão longínquas que não sabia se conseguia recordar com clareza. Um dia experimentara, para não se envergonhar perante os amigos. No dia seguinte, quis voltar a viver as sensações do dia anterior. Era só para saber como era aquilo. Não queria ficar dependente. Tinha uma personalidade forte e não era qualquer um ou qualquer coisa que lhe ia destruir a vida. Já nessa época sabia que a dependência era a maior de todas as doenças.
Depois, sem saber como, foi experienciando tudo. E, para poder comprar, foi levando de casa dos pais tudo o que pudesse trocar por aquele pó branco que o arrastava vertiginosamente. Foi há muitos anos: o pai ameaçou tirar-lhe as chaves de casa. Não quis saber e foi então que começou a viver na rua. De expedientes, de pequenos furtos, de assaltos ligeiros. Foi preso. Só são presos os pobres – afirmava. No fundo sabia que não podia continuar a destruir-se e a destruir os que à sua volta circulavam.
O meu menino é d'oiro/D'oiro fagueiro/Hei-de levá-lo no meu veleiro” – era a voz da canção a persegui-lo na noite escura.

domingo, 3 de maio de 2015

ADORO-TE, MÃE


Catarina Vaz

E foi assim que tudo começou.
Eu cheguei,
e tu viste-me chegar,
chorar,
chamar por ti até te encontrar.
Eu procurava-te.
Tu respondias ao meu abraço,
ao carinho,
ao amor...
E assim nos encontrámos
Mãe e filha
As duas passeámos pela vida
Primeiro, ao colo
depois de gatas,
e enfim de pé.
Sempre contigo
Ah, como é bom ter-te!
Contigo...
Contigo aprendi a viver,
aprendi a sonhar,
aprendi a cantar
e até a chorar.
Contigo...
Contigo, sou feliz!
E amo-te!
Amo-te mais do que tudo,
pois este amor,
este amor de Mãe,
é enorme,
é um mar sem fim,
é a terra em paz,
é o poema mais lindo do mundo!
Enfim,
é o nosso amor.
Amor de Mãe,
Que vive comigo,
sempre,
sempre e para sempre.
Para sempre comigo
Para sempre contigo...
Este Amor,
amor materno!
Amor de quem nos ama
Como tu, minha mãe

Catarina Vaz ©2015,Aveiro,Portugal

sexta-feira, 1 de maio de 2015

DEDOS DE FADA


Maria Celeste Seabra


...saciam a sede da jornada

Dedos que a Vida tocam com amor,
Teus dedos são, assim, dedos de fada,
Tornando menos dura a própria dor,
Suavizando as pedras da calçada!

Dedos que levam água no calor
E saciam a sede da jornada;
Dedos que têm asas de condor
E transformam a noite em alvorada!

Dedos que traçam sulcos na distância,
Que orientaram toda a minha infância,
Fazendo dela um hino, uma canção!

Minha Mãe, eu te lembro com saudade
E hoje sinto ainda a suavidade

Dos teus dedos de fada em minha mão!

Maria Celeste Seabra ©2015,Aveiro,Portugal

terça-feira, 28 de abril de 2015

Anda lá, Jaquim...



Maria José Pereira

Era eu ainda bastante pequeno e já a minha mãe dizia:
– Anda lá, Jaquim, que não é na cama que se arranja plim-plim!
Pouco fui à escola. Também não conseguia aprender grande coisa.
A minha mãe via mesmo mal. Usava uns óculos muito graduados. Era uma autêntica " caixa de óculos".
A minha mãe tinha mais filhos, os meus irmãos, mas ela não lhes dizia: "Anda lá Jaquim, que não é na cama que se arranja plim-plim!"
"Anda lá Jaquim..."
Eu acho que a minha mãe descobriu em mim este talento para arranjar plim-plim.
Quando já era mais crescidito, comecei a ir para a cidade, que era o sítio onde andavam mais pessoas nas ruas. Acho que a minha mãe percebeu isso.
A minha mãe andava sempre triste. Devia ser por causa do meu pai. Ele bebia uns copos a mais e quando chegava a casa era uma grande confusão!
 E lá ia o Jaquim, todos os dias, para a cidade, para arranjar plim-plim, para a mãe não ficar zangada. É que ela zangava-se, mesmo, se eu não aparecesse, em casa, com o plim-plim!
Depois de muitos anos a pedir esmola, comecei a observar os polícias de trânsito e pensei: Vou arranjar um apito e um livro de passar multas.
Assim fiz.
Fui para um sítio onde passavam muitos carros, apitava, fazia de conta que passava multas e o certo é que ia conseguindo algum plim-plim. Todos os dias entregava plim-plim à minha mãe.

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Olhó Noticias, olhá Flama

Maria Helena Linhares

Habituara-me a ver a sua figura a deambular dentro da estação, não a lançar o pregão como os outros vendedores faziam: olha o Século, olhó Notícias, olhó Record. Mas a murmurar, (penso agora, talvez por falta de forças) o que desejava ser o mesmo pregão: Olhó Notícias, olhá Flama.
E lá se ia arrastando, com as costas muito dobradas, ajoujadas ao peso do enorme sacão onde transportava todas as notícias do mundo...
Não andava, arrastava os pés, calçados com enormes alpercatas feitas de restos de
"Senhora dos jornais!"
pneu, vestida com uma enorme bata azul que, nas costas, a amarelo, devia dizer Jornais, pois pouco mais se via que o J. O resto, escondido pela mercadoria, espreitava fora do saco. Na cabeça, um lenço escuro, colocado às três pancadas, com as pontas atadas sob o queixo, não com a pretensão de embelezar mas para esconder o cabelo maltratado.
Usava uns enormes óculos, com lentes de fundo de garrafa, e, pela sua pouca visão, arrastava os pés e o corpo pesado, vergado pela carga que, sem querer, arrastava também os que apressadamente se atravessavam no caminho pesado daquela vida sofrida.
Exalava um cheiro a álcool que tresandava e incomodava os demais. Crianças e adolescentes inconscientes às vezes empurravam-na para lhe provocarem os impropérios e pragas que saíam da sua boca enfurecida.
Eu não conseguia achar qualquer graça àquela espécie de brincadeira, para mim não tinham qualquer piada pois levava à letra o que a minha mãe recomendava – com vinho ninguém se meta – mas cobardemente não fazia frente aos outros.

domingo, 19 de abril de 2015

O OLHAR QUE NÃO ESQUECE

Clavel 


Os animais manifestam sentimentos, pelos movimentos do corpo e pelo olhar. Lembro a fidelidade do “Boris” um boxer que, na sua irrequieta aflição, chorava quando pressentia passos de saída da porta principal da casa. Ele lia os mínimos gestos, gestos que indiciavam a partida, em breve...
Bastava que o saco fosse deixado nas proximidades da entrada na casa para ele saracotear os seus nervos. Ziguezaguiar a elasticidade dos quadris. Adensar a sombra lânguida do olhar.
Cada pessoa é o seu olhar.
Como nas sentinelas que fazem parte do quartel guardado, os olhos são instrumentais e integradoras da alma. Neles se reflete a essência e virtualidades da alma. Olhar é manifestação explícita da vida. Com a extinção  da vida fecha-se para sempre  a cortina que comanda o olhar.
Cada pessoa é o seu olhar. Além de ver dá que ver. Penetrar no olhar de alguém é aceder à raiz mais profunda do seu ser.
Pelo olhar se chega ao labirinto do cardume de pensamentos que nomadizam na mente.
Pelo olhar se transmite a mais convincente nostalgia, a saudade, a tristeza, a alegria, a inquietação, a esperança, o cansaço, o prazer, a dor, a raiva, a ameaça, o ódio, a ternura, o amor, a paixão, a compaixão, o desespero, a esperança e por aí adiante.
O olhar quando terno é doce, envolve e adoça quem o contempla e o sabe entender.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Português, sexagenário, europeu.

José Luís Vaz

A manhã preparava-se para se despedir e o sol de inverno trazia o conforto e bem-estar que a noite gélida tinha usurpado. Naquela esplanada, recatada, abrigada de ventos fortes e com uma privilegiada exposição solar, permaneciam amantes da acalmia alimentada pelas leituras e pela soberba vista de tanto mar.
Um homem de barba branca e farta com cabelo ralo da mesma cor, passava ali imenso tempo observando a imensidão daquele mar, aparentando, talvez, um olhar vazio, como se esquivando do mundo naquele oásis com pensamento vago. Como um vento fraco mas incomodativo, o cérebro exibia-lhe lembranças em que a esperança e a ambição de tempos idos se debatiam agora com o desconsolo e a decepção de uma Europa decadente.
Jovem adolescente, obrigado a viver os ditames da ditadura, sonhou com ela, ali tão perto, continente da liberdade!

                                               Hoje:
Nem sei que diga...
Nem sei que diga
Nem sei que conte
Que sou, afinal, eu?
Neste fado europeu

Em tempos de servidão vinham notícias escondidas e camufladas que alimentavam aquela esperança de que tudo poderia ser diferente. Atravessavam Espanha, com pés de veludo, espalhando o apetite para a viragem da ditadura que também por ali desrespeitava os mais elementares princípios de cidadãos com dignidade.

domingo, 12 de abril de 2015

O Pai Guilherme

 Maria Cacilda Marado 


Chamava-se Guilherme; um nome pouco vulgar para mim, na época em que eu era ainda menina. Um nome que eu pronunciei poucas vezes, apenas quando me perguntavam o nome do meu pai - Guilherme Carneiro Marado -, dizia eu à espera dos sorrisos enviesados que às vezes deixavam entrever os inquiridores. Eu sorria para dentro e pensava comigo: tomaras tu ter um pai Guilherme como o meu, um pai doce que me dá mimos, beijos, abraços. Um pai que me protege da minha mãe que não me perdoa uma. Na verdade, embora ela me amasse muito também, cabia-lhe o menos bom: mandar-me estudar, não me deixar brincar o dia todo, mandar-me ir para a cama cedo, etc., etc.

... o seu jeito doce de lidar comigo, o seu modo de me amar.
Mas voltemos ao meu pai, pois é dele que vou continuar a falar, sobretudo daquele seu jeito doce de lidar comigo, do seu modo de me amar. Enquanto pequena, os seus braços eram os mais acolhedores do mundo e os seus beijos os que estavam sempre cheios de promessas.Com que alegria o recebia quando ele chegava a casa, à noite! Rita Joana, perguntava-me, como correu o dia? Portaste-te bem? Obedeceste à mãe? Eu atirava-me a ele e os meus olhos diziam tudo…Depois, vinha a recompensa ou a desilusão. E como eu sofria quando o via triste comigo! E dizia de lágrimas nos olhos: amanhã vou ser mais obediente, pai. E isto era o suficiente para o ver de novo feliz e sentir os seus afagos.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

VIDA SULCADA

Fernanda Reigota


Eu sei que vou!
Minha vida sulcada tem a aurora na lembrança.
Eu sei que fico!
A teia da minha vida foi urdida com fios de esperança.
Eu sei que quero
Em cada esquina uma alvorada futura!
Eu sei que tenho
Dos meus príncipes o quente abraço da ternura!
Nesta vida, em que não há longe nem perto, 
Como quem colhe flores
Alenta-me minha incerteza.
Nesta vida, que é sol encoberto,
As aves riscam o céu azul
E estou tranquilamente inquieta, sem tristeza.
Fernanda Reigota ©2015,Aveiro,Portugal

terça-feira, 7 de abril de 2015

Assim pensou assim fez.

Maria José Pereira


Meteu-se no carro e rumou por aí...
A pressa  de chegar era mais  que muita, mas não  queria transgredir. Tinha de ficar calmo e não carregar  demais  no  acelerador. 
Deliciou-se a contemplar o campo, que  começava a ficar salpicado  de flores minúsculas, roxas,  amarelas, vermelhas, lembrando uma pintura de Monet.
O ambiente era quase silencioso
O ambiente era quase silencioso, não  fosse o chilrear  da passarada. 
E, quão apaziguador era aquele espaço  a não perder de vista...
Mais uns quilómetros e, finalmente, chegou à  pequena localidade, junto  à praia. 
As casas, poucas, baixinhas, pintadas de branco. 
Numa ruela estreita, numa casa branca como a neve, os amigos esperavam-no.
Foi só tempo de pousar a mala. O mar sereno esperava-os.
As pequenas ondas espreguiçavam-se na praia, como a querer revolver a areia dourada. 
Os raios de sol, já, bastante, fraquinhos, iluminavam o mar.
Depois de tão longa viagem, chegou a altura de descansar. - pensou. E assim pensou, assim fez.


Maria José Pereira ©2015,Aveiro,Portugal

sexta-feira, 3 de abril de 2015

INCITAMENTO

Clavel

Não percas tempo à procura da verdade

É excessiva a poalha da informação
que por abusiva e prolixa
cria notável confusão.
Ninguém vê claro as estradas do amanhã
Ninguém sabe se mora ou não
uma gorda lagarta
no coração rosado duma maçã.

Não percas tempo à procura da verdade
porque nem ela sem máscara
entra nas portas da cidade.
Não te guies pelas barreiras do medo
que te inibem do caminho certo;
usa a intuição
onde podes adivinhar os limites do horizonte
e saber de que fogo nasce o vento.

É bom conhecer o fogo de que o vento nasce
que nunca perde, e jamais se perde.
Segue o vento sem medo,
não evites as mãos do vento que lavam a face
da bandeira da  liberdade
e continua a proclamar vitória.

Clavel ©2015,Aveiro,Portugal

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Se bem pensei melhor o fiz

Maria Jorge


Hoje acordei, sentei-me na cama e de repente senti uma vontade desmedida de transgredir, de não fazer nada que tinha planeado no dia anterior.
Esta é a altura do ano em que normalmente faço uma vistoria à minha casa, e, entre outras coisas, revolvo gavetas para depois as deixar um pouco mais desocupadas, dando outro destino às peças que considero mais inúteis para mim e talvez mais úteis para alguém.
Desperdiçar este dia?
Mas… o dia hoje amanheceu radiante com o sol a espreitar pela janela do meu quarto.
Desperdiçar este dia? Nada disso, este trabalho podia esperar. Há coisas muito mais interessantes para fazer, pensei.
Se bem pensei, melhor o fiz. Peguei as chaves do meu carro e desafiei a minha companhia habitual.
Contemplando aquela extensão de mar, fechei os olhos e deixei-me levar pelo silêncio da praia deserta, interrompido de vez em quando apenas por alguma gaivota mais atrevida ou pelo sussurro daquelas pequenas ondas que teimavam em quererem molhar-me os pés.
Regressei a casa ao fim da manhã. Afinal valeu a pena não arrumar gavetas. 

Maria Jorge ©2015,Aveiro,Portugal
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