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J. Carreto Lages
Algumas nuvens pavoneavam-se
bem alto, vindas em turismo, de muito longe, apenas para nos visitar em seu
recreio e lazer, e até pareciam acenar promessas de que a chuva ia chegar, o
que já não acontecia há muito tempo. O diminuído viço do “renovo” já exibia, em
várias culturas, a notória falta da ternura líquida da água para se
dessedentar. Os agricultores estavam justificadamente preocupados, inventando
várias razões para a anormal escassez da água nos charcos, nas nascentes e nas
ribeiras. Tanto cuidado e trabalho na sementeira, na adubação, na monda e a
água a minguar em todo o lado, a preanunciar uma má colheita dos produtos das
culturas de regadio. A colheita do sequeiro havia sido a habitual, com as
geadas a afectarem a produtividade.
Parecia que a natureza se
desconcertara, com o rodar dos tempos, talvez por canseira, ou alguma mão, a
ela estranha, andava a intervir na essência do seu percurso.
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Até as giestas haviam florido mais cedo |
Até as giestas, naquele ano,
haviam florido, muito mais cedo, coagidas pelo estímulo de uma vaga de calor
que viera do deserto africano e que, talvez, enamorada pelas belezas das nossas
terras, se deixara agarrar e ameaçava continuar. As giestas negrais já haviam
formado a vagem, que ostentavam com vaidade na aridez e secura dos campos.
As aves, durante o dia,
refugiavam-se nas árvores das hortas ou nos salgueiros, freixos e amieiros dos
terrenos de pastagem, onde a temperatura era mais fresca. E quedavam-se na
modorra, escudando-se numa falsa letargia para que se ignorasse a sua presença