Lindonor Silveirinha
Arrumou o carro e, depois de
o trancar, dirigiu-se a casa. Era um primeiro andar numa rua calma e, àquela
hora, quando a noite se aproximava, não se via ninguém.
Abriu a porta, que estava
devidamente trancada com duas voltas da chave e procurou o interruptor às
escuras. Fez-se luz. Fechou novamente a porta, poisou a mala e só então sentiu
que estava em casa.
Passara uns dias com uma
familiar em Lisboa e, agora, estava de volta. A primeira sensação foi de
solidão. Não havia ninguém para a receber. A cadelita, sua fiel companheira
tinha morrido e a pouca família que restava, vivia longe. Sentiu um arrepio de
frio e tratou de abrir as luzes o que a fez sentir-se mais confortável.
Dirigiu-se à salinha de estar e ligou a televisão para ouvir vozes.
....a sua casa era maior que o mundo |
Então sentou-se na sua
cadeira habitual e passou um olhar ao redor da sala. Estava tudo como deixara:
a mesa de camilha com as revistas habituais; o sofá com as almofadas de renda
feitas pela mãe; as cómodas com as fotografias do pai, da mãe e do irmão
falecido tão cedo, os quadros nas paredes…A televisão projectava um filme e a
sua atenção ficou presa numa cena de amor. Também ela vivera cenas como aquela,
mas agora estava só.
A sua parente insistira com
ela para que ficasse mais tempo, mas ela sentia que não pertencia ali. Não era a
sua casa, não era o seu quarto. Tudo o que a rodeava era-lhe estranho. Enfim,
apesar da gentileza com que era tratada, dos passeios que fazia, tinha saudades
do seu cantinho, onde era senhora e mandadora. Tinha que voltar. A sua casa era
pequena e singela, mas era lá que vivia as suas alegrias e as suas tristezas.
Em nenhum outro lugar se
sentia à sua vontade como ali. O mundo lá fora era imenso, mas, para ela, a sua casa era maior que o mundo.
Lindonor Silveirinha ©2015,Aveiro,Portugal
Uma forma simples e bonita de transparecer um sentimento tão profundo: a individualidade de cada pessoa.
ResponderEliminarA casa, o nosso refúgio, o ancoradouro da nossa alma...Gostei muito. Parabéns à autora.
ResponderEliminarE quando a casa deixa de ser o nosso mundo a vida perde-se e escorre pelas nossas mãos, esvaindo-se num nada que parecia tudo.
ResponderEliminarUm texto que exprime bem a ligação que existe entre cada um de nós e a sua casa. Gostei, Lindonor.
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