quinta-feira, 27 de março de 2014

Virar o mundo ao contrário

EVOLUIR agradece ao autor o envio deste texto para publicação

Que linda a foca criança de pelugem branca, fica-lhe o vermelho cor sangue tão mal. E o cavalo, negro, castanho, malhado, tantos filmes, tanto espectáculo, e o burro de carga, a mula
A foca criança
da cooperativa, tanta história, tanta estrada.
Senhores, como me apraz o elevar da suricata, atenta, sagaz a qualquer predador atrevido que queira entrar no seu dominar, debaixo da terra, a sua família secreta. Lá ao longe, uma explosão de pó atravessa o horizonte, búfalos, bisontes, manadas a deixar para trás terra calcada à procura de outra morada, uns ficam outros seguem, envolvidos numa nuvem de força unida.
Porém tenho medo do tubarão branco, da baleia assassina, da enorme anaconda, e da peluda tarântula, patuda, gorducha, silenciosa, até me arrepio agora. E toda esta macacada faz-me lembrar do macaco piolhudo, então o narigudo é uma mossa, o malandro. Porém, o gorila que eu amo canta o fado, já quase sem ninguém, valha-lhe o Godzilla e a loira na mão, e quem já os olhou nos olhos, eu já, na televisão, sentem a (des) emoção de testemunhar uma futura memória.
O que são inocentes?
Porquê o fado, pergunta o pequeno, no gorila e no resto da turma, chama-se extinção, pela expansão, ambição, maldade e muita transgressão, dos outros. Digo-te quem no final. Agora os animais fogem, todos, e não há Arca de Noé, vão e outros ficam, porque chora o elefante junto à cria infinitamente, é comovente, parecem-se a nós. Quem sabe não andam em conversações os dragões que habitam numa ilha da Indonésia, os leões reis da selva, e o Nessie, vale tudo, combinando uma invasão, quem sabe uma revolução, não, claro que não. Seria um mundo ao contrário, claro que não. O mundo certo é assim: nós vemos os animais, que são maravilhosos, depois vemos os assassinos, que é um horror, e depois a nós, todos juntos envoltos num fedor de culpa que agora não interessa para nada.

Não há inocentes, diz o panda da sua árvore. O que são inocentes, pergunta o panda engraçado. Não é nada, dorme, diz a mãe canguru à sua cria dentro da sua bolsa protegida, escondida.
Não é nada dorme, animal.
Não é nada dorme, filho.
Parece igual, não é.
Corram muito, os que vos amam não chega, seria preciso virar o mundo ao contrário, ninguém tem força, só a natureza. Vão, durante a noite enquanto o cérebro dorme, vão.
Ficará aqui alguém que nos travará, o cão e o gato, o periquito e o pato. Esperarão
Seria um mundo ao contrário...
eternamente pelo seu dono, pelas suas pernas, pelo seu colo, pelo seu falar parvo e doce, mesmo que não venha, que nunca venha, ou que fique esquecido por outro interesse qualquer, eles esperarão, sempre, com o mesmo amor, sem julgar, exigir, magoar, amarão (a nós) até ao último fechar de olhos.
Meu Deus, que alegria a minha, que no meio da minha hipocrisia, te agradeço por não lhes teres tu dado um cérebro. Só corpo e alma.
O homem e os animais. 
Racional.
Irracional.

Qual deles é, sabes tu dizer?

Albertina Silva Monteiro ©2014,Aveiro,Portugal

5 comentários:

  1. Na realidade o homem não é, não foi nem nunca será o detentor da verdade plena, se é que ela existe realmente. Assim mesmo não será também o único ser racional à face da terra até porque no comportamento animal há ainda muito por desvendar. Agora, aquilo de que não podemos duvidar é que os seres humanos são capazes do melhor e do pior dentro de uma dimensão que rasga universos e delimita verdades. Este é um trabalho, como todos os que já conhecemos da Albertina, cheio de uma força que nos faz parar e deglutir, palavra a palavra, cada frase que se enredeia num conceito de homem humano e homem animal. Excelente, Albertina, gostei mesmo muito.

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  2. "Não há inocentes", mas, como muito bem sugere o texto, há vítimas da irracionalidade que o homem está a imprimir à sua relação com os animais.

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  3. "Qual deles é, sabes tu dizer?" Como se a maravilha, a magia e a beleza não fossem suficientes na elaboração deste texto está-lhe subjacente a inteligência que nos obriga a pensar ou preferencialmente repensar conceitos de tudo e de todos.

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  4. Desfilam, perante os nossos olhos, as mais variadas espécies zoológicas. O mundo animal (irracional?), sem "cérebro", mas com "alma", a confrontar o homem (racional?) com a sua irracionalidade. Um texto a impor uma profunda reflexão sobre a relação do homem (com cérebro) com os outros animais, com a natureza. Gostei muito, Albertina.

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  5. Grandioso texto para se ler, reler e refletir. Qual o futuro da humanidade? Para onde caminhamos?

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