Maria Helena Linhares
Éramos um grupo de crianças, saltitante e garrido. Pertencíamos ao
antigo ensino primário – da 1ª à 4ª classe.
Rapazes e raparigas, as meninas mais vistosas, mais enfeitadas, algumas
com laçarotes na cabeça.
Eles, mais estouvados, empurrando-se uns aos outros, cavaqueando, ou
atrás da bola que iam chutando pelo caminho...
Eram tempos felizes... mas para mim não o eram tanto. Dentro de mim
havia como que um vazio, um desconforto, por um desejo tão contrariado que me
provocava uma tristeza profunda, um desalento imenso!
Íamos andando rumo à escola e ia mirando disfarçadamente algumas
colegas, pensando com os meus botões que elas é que tinham razões para serem
felizes e rirem às gargalhadas por tudo e por nada.
Ah, se eu fosse uma delas como seria plenamente feliz! |
Mas eu era orgulhosa e não revelava a nenhuma amiga o meu sentir, a
razão da minha tristeza.
Ah, se eu fosse uma delas como seria plenamente feliz!
Iria rir tanto, tanto, de boca escancarada, e adeus tristezas: —
correria contra o vento, ainda mais
do que ele, andaria às voltas, de mãos ora
na cabeça, ora postas nas saias para que elas não esvoaçassem... ai como eu
iria ser tão feliz! Mas não, a minha mãe explicava, desdobrava-se em fazer-me
compreender o incompreensível, mas qual quê? Quanto mais o fazia, menos eu
compreendia. Porque não podia ser como a Celina, a minha vizinha? Seria fácil,
tão fácil, eu prometia portar-me muito bem, estudar mais, mais isto mais
aquilo...
Não! Não sejas teimosa e cala-te! O assunto morreu aqui! Não há mais
conversa!
E o tempo decorreu... Já adolescente o meu sonho adormecido parecia por
vezes animar-se e renascer com mais força, mais energia, mais mania –
respondiam às interpelações que continuamente fazia.
Só me restava sonhar, pois era no sonho que eu realizava o que tanto
queria.
E como era bom sonhar! Sonhar, esquecer o velho sonho irrealizado. Mas
qual quê, não era possível, pois logo numa rua deparava com alguém ostentando o
que eu tanto almejava. E como eram belas! Loiras, ruivas, morenas, deparava com
elas e logo o meu tormento retornava com força!
Agora, agora já sou adulta, e consegui exorcizar todos os meus
demónios, e já perdoei porque compreendi finalmente as dificuldades na
realização dos meus desejos, do meu sonho!
E agora é tarde, muito tarde para poder ostentar um par de tranças no
alto da cabeça!
Maria Helena Linhares ©2014,Aveiro,Portugal
Este sonho não é necessariamente passado, Helena! Porque não experimentar agora? Quem sabe não virava moda?
ResponderEliminarGostei muito da forma como desenvolveu o tema prendeu-me do principio ao fim.