Maria Celeste Salgueiro
Era alta, elegante, porte airoso. Quando a vi pela
primeira vez meu coração disparou.
Era uma manhã de Verão
luminosa e brilhante. À minha frente a praia estendia-se desnudada e as ondas
agitavam suas crinas brancas em louca cavalgada, vindo deitar-se aos meus pés
cansadas, na areia. As palmeiras balançavam as suas cabeleiras verdes doiradas
pelo sol e flores de buganvília, transbordando de cor, vestiam os muros junto
da praia e subiam ao encontro do sol. Nuvens brancas, quais flocos de algodão,
flutuavam sobre a montanha longínqua onde as árvores quase tocavam o céu. Era
uma manhã perfeita numa perfeita praia tropical. Nesse momento sentia-me feliz.
Aspirei deliciado o cheiro a maresia e o aroma das flores que o vento trazia
até mim.
Palavras para quê? |
À minha frente eu via a sua
silhueta recortada na luz. Caminhava lentamente, as pernas altas e elegantes em
compasso de dança deixando sulcos na areia molhada. Seguia-a de longe sem que
ela me visse. Senti despertar em mim a minha veia artística e não queria perder
nenhum dos seus movimentos. De repente parou e olhou na minha direcção. Julguei
que ia retroceder mas afinal continuou a andar no seu passo ritmado. Nesse
momento tudo se diluiu no tempo e no espaço. Nada mais senão ela existia no meu
campo de visão. Como um adolescente enamorado continuei a segui-la sem coragem
para a abordar. Bastava-me olhá-la para me sentir feliz. Palavras para quê? Não queria chegar mais perto com medo de quebrar o
encanto.
De repente, ao longe o céu
tornou-se cinzento, incendiou-se numa onda de luz e ouviu-se depois o ribombar
de um trovão. Foi o bastante para a assustar. Começou a correr e buscou abrigo
numa gruta cavada na rocha. Mas eu não a segui. Retrocedi com medo da
tempestade que se aproximava, pisando os sulcos deixados por ela na areia
molhada.
Porém, dentro de mim o sol
continuava a brilhar e a beleza daquela manhã perfeita continuava intacta,
assim como a imagem daquela ave de pernas altas e elegantes: a minha bela
Garça.
Maria Celeste Salgueiro ©2014,Aveiro,Portugal
Uma "bela Garça" por quem alguém se sente atraído: motivo simples que, tratado por pena de mestre, nos presenteia com um texto simplesmente belo e arquitetura surpreendente.
ResponderEliminar"O ribombar de um trovão" assustou a "bela Garça" e a escritora "pisando os sulcos deixados por ela na areia molhada" assumiu, escrevendo, toda a beleza e elegância do traçado desenhado pela ave.
ResponderEliminarA graciosidade e força que este texto transmite conduz-nos por um caminho que se esconde e se desvenda em cada linha. Sem a vermos, sem percebemos sequer do que se trata, somos conduzidos por palavras, colocadas com mestria e saber de quem manobra a escrita como um ato quase impulsivo, que saem de dentro e se espalham por quem tem o privilégio de a poder saborear.
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