©Idalinda Pereira
(A ser entregue no dia do meu nascimento)
Ainda
não sabias que estavas grávida, mas eu já existia.
Eu
sabia que era fruto do amor, de uma paixão, e não do acaso ou de um descuido.
Eu
vivia em silêncio, dentro de ti, e tu continuavas a ignorar-me. Foi necessário
haver uma explosão hormonal para te provocar tonturas, enjoos e mau estar - eureka!
Aí fez-se luz!
Então, pela quinta vez, segredaste ao ouvido do
meu pai: estou grávida. Fiquei mais tranquila porque ia ser reconhecida.
Quando
se deu a minha divisão celular, senti-me muito aflita e tive que te roubar
muita energia, porque precisava de oxigénio para a formação do meu cérebro,
ossos, vasos sanguíneos, músculos e todos os meus órgãos, o que te causou um grande
stresse e muito nervosismo. Eu chamava por ti, mas mesmo sabendo que eu já existia,
continuavas indiferente até mesmo ignorando-me!.. Só passados sessenta dias, é
que tomaste plena consciência de que, nas tuas entranhas, havia um novo ser e
que eras a pessoa mais importante para ele! Então começaste a ajudar-me.
Tiveste
cuidado com a tua alimentação, mais horas de descanso, pediste ajuda
especializada para que nada me faltasse, sabias que só assim eu viria a nascer
saudável, perfeita e escorreita, como é o desejo de todas as mães.
Gostei
muito de me aninhar no teu ventre e permanecer nele durante as várias fases do
meu crescimento e desenvolvimento: ovo, embrião e feto.
Através
da placenta, deste-me tudo o que eu precisava. Sei que sofreste, o teu stresse
aumentava, mas não eras a única. Eu. por vezes, também ficava muito irrequieta
com falta de oxigénio; tu não respiravas corretamente e eu tinha que aguentar
com o meu stresse e com o teu! Mas depois passavas a mão na tua barriga e eu
acalmava, sentia-me bem.
Chegado
o final dos nove meses, começaste a sentir um certo desconforto, a porta por
onde eu ia sair começava a abrir e passaste um período muito doloroso! Sofreste
com a pressão das dores físicas, mas eu sofri muito mais porque não queria
sair! Sentia-me bem, sentia-me segura! O teu organismo reuniu forças para me
expulsar, eu não tinha hipótese para dizer não. A porta era tão estreita que me
limitava a saída, mas lá dentro não podia ficar! Sendo assim, muni-me de toda a
energia, encavalitei os ossos do meu crânio, estendi os braços ao longo do meu
frágil corpo, estiquei as pernitas e aí vou eu para o exterior. À saída, fiz
uma expiração profunda, o líquido que ocupava os meus alvéolos pulmonares saiu para
dar lugar ao oxigénio e chorei!
Não
gostei que me separassem de ti, mas fizeram-no com aquela tesoura que ainda tem
o mesmo nome.
Hoje
eu digo: Obrigado mãe, porque podias ter-me rejeitado e pôr fim a tudo isto e
eu não estaria aqui hoje para te recordar, homenagear e dar-te a conhecer os
meus netos, teus bisnetos.
Bem
hajas onde quer que estejas.
Idalinda Pereira ©2016,Aveiro,Portugal
Idalinda Pereira ©2016,Aveiro,Portugal
De Laura Carvalho recebemos o seguinte comentário:
ResponderEliminar"Adorei esta carta "à mãe" é tudo isso para recordar a vida inteira."
De Ró Vale recebemos o seguinte comentário:
ResponderEliminar"Muito bonito,um comovente tributo ás mães."
De Ana Maria Figueira recebemos o seguinte comentário:
ResponderEliminar"Grande tributo ás mães. Parabéns."
De Ascensão Anastácio recebemos o seguinte comentário:
ResponderEliminar" Muito bonito e inspirador,este trabalho é a experiência muito motivada da autora ...maravilhoso!"
Encantadora carta às mães . Parabéns Idalinda
ResponderEliminarNove meses que passam como uma terna brisa de fim de tarde quente. De mãos dadas, graça e conhecimento, agarram o leitor a uma lindíssima homenagem à mãe.
ResponderEliminarAo ler este trabalho sobressaiu-me a frase:"a ser entregue no dia do meu nascimento". E pus-me a pensar que talvez esta seja a primeira carta que vejo escrita de um filho para uma mãe que há-de ser. Esta é a carta que anula todas as outras que escrevemos à mãe que se foi. E, nesta dualidade, resta-me pensar que a tua ideia foi excelente porque reflete um amor presente. Sempre.
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