© Vitor Sousa
Opaco, persistente, frágil,
compulsivo no descrédito dos valores mundanos, o João soava a Alabastro.
Nascido para carregar
penitências, era a personificação das noites revoltas, da febre, das maleitas e
de um vómito cáustico oriundo de um qualquer manifesto de repúdio aos deuses ou
às contrariedades de bom comportamento.
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Opaco,persistente, frágil, o João soava a Alabastro |
O seu universo tinha de ser
retocado, amarfanhado e reinventado por ele, como se ele fosse o princípio e o
fim de todas as coisas na plenitude desordenada do instinto.
A perspectiva da observância era
antagónica na captação pictórica do mundo, sempre pautada pelo confronto às
verdades absolutas e à força absurda das razões que enjaulam os caminhos.
Era um artesão da alma.
A vista da imensidão, ou a mão
pousada no sossego da muralha castelã imprimiam um derrube do temporal, onde
todo o rasto histórico é agora. A relação com o outro era fácil, espontânea,
afável e curta.
A vivência humana na sua
complexidade, imprimia-lhe sempre uma impressão de transacção comercial
submersa movida por vómicas cumplicidades sarapintadas a custo por retalhos
necrófagos de aparência isenta e sadia.
Até a caridade, supostamente
nobre e altruísta era castrada pela contrapartida do amanhã desconhecido, pelo
dilema medonho de fazer o bem para garantir o bem-estar sem vir a precisar do
pão alheio ou de estender a mão à vergonha do pedir.
Valiam-lhe os bichos, para lhe
nortear as contendas e harmonizar a existência.