Albertina Vaz
Sou um homem comum: tenho cerca
de um metro e setenta, não sou gordo nem sou magro, tenho olhos castanhos,
cabelo curto, visto calças de ganga aos fins de semana e, quando posso, gosto
de passear à beira-mar ou de ficar sentado numa esplanada, olhando o horizonte
sem pensar em nada. Gosto de crianças que riem, de pássaros a voar, de gaivotas
que circulam, do nascer do sol, duma manhã de chuva miudinha e de barcos que cortam
as ondas e rasgam o mar. Gosto duma música dolente, de um toque de guitarra, de
um som de piano, de um livro de muitas páginas, de uma página em branco e de
uma foto de reflexos.
E num momento, sem saber como nem
porquê, senti-me ainda mais vulgar: estou desempregado!
Primeiro, foi não acreditar no
que estava a ouvir: entra, entra. Vamos ao assunto sem mais delongas: tu sabes
que isto está mau, que já não se vende como antigamente, que temos que
racionalizar os custos, e tu também já não és novo… Não, não, tu és um
excelente profissional, tens um imenso talento… Mas é assim: passa pelos recursos
humanos e tenho a certeza que em breve conseguirás até uma melhor situação.
Assim, de um momento para o
outro, como quem bebe um copo de água ou se refresca com a brisa do mar, numa
noite de luar.
Depois o espanto: já não sou
novo? Então com quarenta anos sou velho? E por ser velho já não sei trabalhar,
já perdi capacidades? Pensava que à medida que vivemos adquirimos maior
maturidade, que somos capazes de desenvolver maior volume de trabalho e com
mais qualidade… Mas parece que estava enganado: já não sou novo e estou
desempregado!