segunda-feira, 25 de abril de 2016

A Sinceridade na política existe? Uma palavra que parecia ser mágica

 ©Gil Gilardino

A palavra “SINCERIDADE”, por muito paradoxal que possa parecer, nasceu de uma mentira.

Os estudiosos da semântica contam, segundo reza a lenda, que no tempo do antigo Império Romano se vendiam estátuas com mármore rachadas.Para disfarçar as feridas destas infelizes estátuas, enchiam-se as rachas de cera e, assim, os escandalosos mercantes eram tão prósperos como pouco honestos.Os comerciantes honestos alertavam os seus clientes de que as suas estátuas eram “sem-cera” … e a palavra nasceu.

As diferentes palavras tais como sinceridade, verdade e mentira possuem um forte significado simbólico.Na actual sociedade a simbologia das palavras perdeu o seu peso, criando um vazio pouco confortável para quem todos os dias deve confiar na ética assimilada ao papel da honestidade.

Cada vez com menos transparência social se aumenta a opacidade nas nebulosas dos relacionamentos, no lugar de proporcionar espaços cristalinos do verbo, procurando equidade nos valores da sinceridade ou na verdade.

Em tempos que já foram, existiam nas diferentes sociedades certas tendências espirituais com diferentes filosofias, ateias ou religiosas, garantindo valores sociais, proporcionando uma certa ordem cívica.

Actualmente assistimos a uma verdadeira apoteose da palavra sinceridade da parte dos políticos actuais, horas de comentário nos canais de televisões com eminentes constitucionalistas a analisar todas as versões da importância da palavra DEMOCRACIA. O mesmo consiste na palavra desportivismo - parece que já ninguém sabe interpretar o compreender a expressão delas.Um famoso concílio no século 1101 D.C. deliberou o celibato dos padres, mas, paradoxalmente, os primeiros discípulos do nosso Jesus Cristo eram quase todos casados.

domingo, 10 de abril de 2016

O Patrão

©Vitor Sousa

O Zé já nem lia os jornais, uma morbidez abafada consumia-o por dentro como um fogo pardo.
O olhar vivo deu lugar a um semblante cabisbaixo, as rugas afagavam-lhe a cara em jeito de carícia de morte.
O Zé já nem lia os jornais
A tenacidade, o desafio e o gozo de intempérie desvaneceram como tarde triste em fim de Outono.
Os bancos levaram-lhe tudo, nem uma casita a cair de madura nas encostas da Lousã, herança do seu avô, escapou à fome métrica dos vampiros.
Deixaram-lhe a mesa, duas cadeiras e a cama no apartamento alugado onde ele ainda chafurda memórias entre cartas, escritos e fotos, de um passado recente.
O Artur, amigo de sempre, entretido com o emaranhado da sua pequena mercearia, estranhou a ausência do Zé.
Meteu pernas à velha escada de madeira e, depois de uma ascensão rangida de três andares, bateu à porta.
O Zé saltou na cadeira num sobressalto pasmado.
Ficou inerte na incerteza da visita…
Quem será? Que lhe quereriam mais?
Uma voz afável e ofegante ouviu-se do outro lado.
- Anda lá Zé, vamos beber um cafezito, abre-me essa porta.
Tremulo a lívido, pouco refeito do susto lá abriu a porta e, em tom de desabafo, diz:
- Ainda bem que vieste, já estava aqui a magicar umas ideias pretas que nem te digo…
...abafar tempestades que lhe
secavam o alento
Lá foram na tagarelice de circunstância, abafar tempestades que lhe secavam o alento.
- Não podes ficar aí a remoer a vida, distrai-te homem!
Ouve lá…Queres que te arranje uma companheira?
Pergunta o Artur em tom de riso.
- Só tu me farias rir, num tempo destes…
A conversa desanuviava o desnorte enquanto beberricavam o café.
O Zé lá ia descarregando a mágoa em sulcos de desespero.
- Sabes Artur, foram quarenta anos de descontos, de trabalhos, de salários, de contas, de medos, de muitos nadas que se transformaram em coisa nenhuma.

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Velhos são os trapos

Maria Jorge

Com a esperança de vida a aumentar, tanto a nível particular como a nível oficial, foram criadas diversas condições para as pessoas envelhecerem com mais qualidade de vida.
Proliferaram universidades seniores nos grandes centros urbanos. De norte a sul do país, principalmente na região interior, câmaras, juntas de freguesia e também a comunidade local, criaram condições para ajudar os seniores a terem uma velhice com mais dignidade.
O nosso povo, com as suas características próprias, é multifacetado e, talvez por isso, também de fácil adaptação a novos desafios. E quem, com a nossa idade, já fez desaparecer do nosso cérebro um sonho que nos acompanha desde criança?
Aprender uma nova língua, tocar viola ou outro instrumento qualquer, dançar, fazer jardinagem ou artesanato, ginástica, natação, pintar, conhecer novos sítios e novas gentes, viajar para fora do país, fazer voluntariado, tirar o curso superior que tanto ambicionava e tantas, tantas coisas mais. Pois é, mas, por diversas razões, nunca tivemos possibilidade para isso.
Quantas vezes já não ouvimos alguém dizer: “agora é que eu estou a viver a minha vida” ou então: “temos de aproveitar enquanto temos tempo para isso” e ainda: “agora tenho, para os meus netos, o tempo que nunca tive para os meus filhos”. E que dizer dum grupo de mulheres que se intitulam “as mulheres de Bucos”, todas já reformadas e orientadas por uma estilista, que, desde a criação das ovelhas, passando pela fiação da lã e do acabamento final, fazem peças de vestuário, mostrando ao mundo que aquela arte faz
parte da história dum país e não pode morrer. 
Despedirmo-nos do mundo do trabalho e aceitar a nossa reforma é sermos donos do nosso próprio tempo e, dentro das nossas possibilidades físicas e mentais, poder usufruir daquilo que a vida ainda tem para nos oferecer.
Será pura ilusão o que, de algum tempo a esta parte, está a acontecer no nosso país. Qualquer estação de televisão apresenta diariamente programas com muito pouco conteúdo, todos iguais entre si, mas baseados, segundo estatísticas, nas audiências. 
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...